terça-feira, 24 de novembro de 2009

A grande mãe. Capítulo I: Direção.

O ar dentro do carro está pesado demais para um pulmão maltratado como o meu. O responsável por isso eu não sei dizer quem é. Podem ser os charutos e cigarros insistentemente sugados pelos babacas ao meu lado. Pode ser o cheiro de sangue fresco que vem do porta-malas. Ou pode ser a tensão. Ouço um bater de dentes vindos do banco de trás. Faz frio lá fora, mas eu sei que o que Sergey está realmente sentindo é medo, o mais perigoso dos sentimentos. Ao meu lado, no banco do motorista, Yuri levanta a mão esquerda. Noto a existência de algo estranho embaixo de sua unha. Deve ser cérebro.
- Bohr. A gente precisa fazer alguma coisa. Você sabe disso. – Yuri me questiona, chacoalhando as pernas repetidas vezes.
- É claro que eu sei. E pelo visto eu sou o único aqui que ainda sabe onde está a própria cabeça.
- Seu moleque. Na KGB você não duraria duas horas.
- Você esqueceu que aqui não é a KGB. Não há justiça, só há leis, que para nós não existem mais.
- Seu bolchevista dos infernos. O trabalho era pra ser simples. Um passeio no parque.
Calei e consenti.

De fato, o trabalho era simples. O Pai considerava, no almaço com as instruções, como uma “pequena faxina”. Um traficante pouca bosta estava começando a incomodar as transações entre o leste e o oeste da motherland. Era entrar, erguer as armas, deixar que elas fizessem seu trabalho e sair, levando o mindinho como souvenir. Entrar foi fácil. A porta traseira destrancada trouxe à tona uma estranha sensação de boa vizinhança. E foi aí que a tranquilidade e o prazer em trabalhar chegaram ao fim. Barulhos estranhos vindos do quarto chamaram a atenção. Sergey foi na frente. Abriu a porta. Explodiu em gargalhadas. Eu cheguei depois, seguido de perto pelo Yuri. Diante dos meus olhos, dois animais, um dentro do outro, olhavam assustados para seus capatazes. Sergey só parou de rir quando descarreguei dois pentes da minha Kalashinokov no corpo suado das duas bichas.

Uns segundos de silêncio perfuraram a bagunça que se passava em nossas cabeças. Agora, ouço Sergey chorar. Ele sempre foi fraco. Um peso morto que, de vez em quando, se arrasta, como se pedisse clemência. É filho de Noukhaev, uma lenda na Família devido ao sadismo inexplicável. Deu conselhos ao Pai que o colocaram onde ele está hoje. E é só por isso que ele foi selecionado para juntar-se a mim e a Yuri, os líderes no ranking de mindinhos coletados. Yuri se vira em minha direção. Está tão perto, que posso sentir seu bafo de vodka queimar minhas narinas.
- Pensasse antes de atirar, seu verme. – disse, sem tentar esconder a irritação.
- Sodomia não é passível de julgamento. – respondi, tentando me manter são.
- Seus princípios não valem de nada quando estamos falando do filho do Pai.
- Não tinha como saber que aquela BICHA ERA O TRISTAN. BICHA DO CARALHO. TINHA UM CARA DE CEM QUILOS MONTADO NELE. TINHA UM PAU ENTRANDO NAQUELE LIXO TODO. – foda-se a minha sanidade.
- Isso não nos serve de nada agora.
- É.
- Você sabe o que vai acontecer, não sabe?
- O que vai acontecer depende do que será feito daqui pra frente.
- E depois disso?
- Depois disso o quê?
- Depois de tudo o que faremos daqui pra frente.
- Faremos? Eu sei o que eu farei, e quem quiser sobreviver que me acompanhe.
Ninguém demonstrou qualquer reação. Desci do carro e fui conferir nossas visitas indesejáveis.

4 comentários:

barbara disse...

Cara tu gosta de escrever muito ,viajei fui para tropa de elite,misturado com os russos..
Aguardo outros capitulos.

Ahas disse...

Bem legal kra, bela introdução!
Sergey chora na morte do gay, uma bela rima também.
hahahaha
Aguardo os próximos capítulos,
abraço.

Guilherme Maia disse...

Trama digna de Tarantino, isso porque mal começou. Muito imaginativo e intenso. Deu uma vontade imensa de saber o resto.

Anônimo disse...

Meu deus.. DEMAIS! Sensacional. Ja visualizei uma boa cena!!!!!

Adorei!
Beijos
Tassi